Explicar a guerra aos mais pequenos

Dra. Sophie Fachada

Psicóloga Clínica

Página da autora

Nos dias de hoje, é inevitável que as crianças se deparem com notícias e informações sobre conflitos e guerras através dos meios de comunicação, internet e conversas do dia-a-dia.

Estas notícias podem ser assustadoras e perturbadoras para os mais pequenos, que muitas vezes não compreendem completamente os motivos e as complexidades por trás desses eventos.

É importante abordar o tema da guerra com os mais pequenos de uma maneira sensível e construtiva. Além de ajudá-los a compreender o mundo complexo em que vivemos, abordar este tema de forma adequada pode promover o desenvolvimento de competências importantes para o seu crescimento emocional e social. Mas como fazê-lo? Aqui ficam algumas recomendações:

O fator idade

Primeiro que tudo é importante ter o cuidado de adaptar a linguagem e o conteúdo à idade e maturidade delas. As crianças mais pequenas ainda não conseguem compreender as nuances dos conflitos armados entre povo (muitas vezes nem eu adulta compreendo). No entanto, apesar de não compreenderem, estas crianças não deixam de ser sensíveis às emoções de medo e confusão que estes acontecimentos geram nos adultos em redor. Neste caso é adequado abordar a guerra do ponto de vista emocional, falando com a criança sobre as emoções negativas associadas à guerra: o medo, a angústia, a raiva, o desespero, a desconfiança, a culpa entre outras. Devemos conversar com a criança sobre estas emoções, sobre como é que elas nos fazem sentir. É importante que perceba que sentir estas emoções é normal, mas que há formas saudáveis de as exteriorizar e outras formas não saudáveis, por exemplo, magoando os outros ou a nós próprios (que é que acontece num conflito entre povos).

Transmitir segurança

Aborde o tema quando a criança estiver num ambiente seguro e acolhedor de forma a colmatar o efeito dos sentimentos negativos que possam surgir. É também importante que a criança se sinta à vontade para fazer perguntas e expressar seus sentimentos. No caso das crianças mais pequenas uma técnica possível é sentá-las ao colo ou baixar-se ao nível da criança. Reafirme para as crianças que estão seguras e protegidas, e que existem adultos, como os pais e outros cuidadores, que estão lá para ajudá-las e protegê-las. Transmita uma mensagem de esperança e resiliência, enfatizando que as pessoas trabalham juntas para resolver conflitos e promover a paz.

As imagens de violência

As crianças (e frequentemente os adultos), não conseguem fazer um processamento saudável de conteúdos violentos como imagens e conversas, nomeadamente no formato repetitivo que vemos na cobertura televisiva. Quando expostas a conteúdos violentos da guerra as crianças podem não falar mas muitas vezes dão sinais aos quais podemos estar atentos, por exemplo, mudam o comportamento quando o adulto está a ver este tipo de conteúdo no telejornal ou no telemóvel. 

Devemos evitar expor as crianças a imagens perturbadoras de guerra, mas ao mesmo tempo, não devemos ignorar completamente o assunto, até porque é impossível. Para as crianças, ver as imagens pode ser confuso, mas se acidentalmente forem expostas a conteúdos violentos na nossa presença devemos evitar a tentação de desligar logo a televisão porque pode aumentar a confusão. Uma estratégia possível nesta situação é focar a atenção da criança nas pessoas que estão no local de guerra a tentar corrigir aquele cenário porque o que está a acontecer não é bom (por exemplo os médicos, as ambulâncias, os polícias, etc.). Podemos ainda falar-lhes dos esforços de outros países e organizações para a paz que estão a fazer os possíveis para cessar o conflito.

Escutar

É importante permitir à criança expressar-se para conhecermos a sua perspetiva e medos relativamente àquilo que vê.

Particularmente à medida que crescem e se tornam mais conscientes do mundo ao seu redor, há que escutar para compreender e até saber a que tipo de conteúdos está exposta, por exemplo que comentários ouve na escola. No caso das crianças mais velhas podemos também encorajar o diálogo no qual são exploradas soluções pacíficas para os problemas que originam os conflitos.

Para além das mensagens verbais devemos estar atentos aos sinais de angústia e ansiedade nas crianças e procurar ajuda especializada se necessário.

Utilize atividades de expressão emocional: Ofereça às crianças oportunidades para expressar os seus sentimentos sobre a temática da guerra de forma criativa, como por exemplo através do desenho, pintura, escrita ou dramatização. Isto pode ajudá-las a processar e expressar as suas emoções e sentimentos de uma forma mais segura e construtiva.

Conclusão

Abordar o tema da guerra com as crianças de forma sensível e adaptada à sua idade é fundamental para promover características essenciais para o seu desenvolvimento emocional e social como: a consciencialização, a segurança emocional, a empatia e a compaixão. Ao criar um ambiente de comunicação aberta e segura, podemos ajudar as crianças a compreender o mundo complexo em que vivemos e a desenvolver habilidades importantes para enfrentar os desafios do futuro.

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Dra. Sophie Fachada

Psicóloga Clínica

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Em caso de crise familiar é comum o conflito do casal se estender para os filhos, podendo chegar mesmo a chamada alienação parental, que ocorre quando um, ou ambos os progenitores, avós ou outra pessoa com responsabilidade legal da criança/jovem, manipula a relação entre a criança e o outro progenitor, geralmente com o objetivo de prejudicar ou destruir o vínculo afetivo entre a criança e outro progenitor. Essa manipulação pode envolver difamação, desinformação e alienação emocional, levando a criança a rejeitar ou a ter uma relação prejudicada com o progenitor não alienador.

Será importante referir que por vezes o alienador pode fazê-lo de forma quase inconsciente e até assumir o papel de vitimização que leva o filho a ver o outro progenitor como o principal culpado e até como agressor. É inclusivamente comum ouvir um alienador referir que só está a agir de acordo com o principal e único interesse o da criança.

Este síndrome está cada vez mais presente no nosso dia-a-dia, e a tornar-se um problema social, podendo ter impactos significativos no desenvolvimento emocional, psicológico e social das crianças e jovens envolvidos. Com base em estudos científicos na área da psicologia e psiquiatria, podemos destacar algumas consequências associadas à alienação parental:

  1. Problemas emocionais: Crianças e jovens submetidos à alienação parental frequentemente experimentam uma ampla gama de problemas emocionais, incluindo ansiedade, depressão, raiva, confusão emocional e baixa autoestima. A manipulação emocional e a exposição a conflitos entre os pais podem levar a sentimentos de desamparo e sentimentos de culpa decorrentes da pressão para rejeitar um dos pais.

  2. Dificuldades de relacionamento: A alienação parental pode prejudicar as habilidades sociais e de relacionamento das crianças e jovens, tornando-os mais propensos a ter dificuldades em estabelecer e manter relacionamentos saudáveis no futuro. Eles podem ter dificuldade em confiar nos outros, em expressar as suas emoções de forma adequada e em estabelecer vínculos afetivos seguros

  3. Problemas comportamentais: Podem exibir comportamentos desafiadores, agressivos ou de oposição como resultado do conflito interno causado pela alienação parental e pela lealdade dividida.

  4. Problemas académicos: A instabilidade emocional e a distração causada pela exposição à alienação parental pode interferir no desempenho académico das crianças e jovens, prejudicando a sua concentração, motivação e capacidade de aprendizagem. Eles podem ter dificuldade em se concentrar na escola, em completar tarefas escolares e em alcançar o seu pleno potencial académico.

  5. Risco aumentado de problemas de saúde mental: Estudos sugerem que crianças e jovens submetidos à alienação parental têm um maior risco de desenvolver problemas de saúde mental ao longo da vida, incluindo perturbações de humor, de ansiedade, de depressão, perturbação de personalidade e até mesmo pensamentos suicidas.

  6. Lealdade dividida e conflito de lealdade: As crianças e jovens envolvidos em situações de alienação parental muitas vezes sentem-se pressionados a tomar partido em relação a um dos pais, o que pode criar um conflito de lealdade significativo. Eles podem se sentir obrigados a escolher entre os pais, o que pode causar angústia emocional e sentimentos de culpa.
  7. Impacto na identidade e autoconceito: A manipulação parental pode afetar a forma como as crianças e jovens se percebem e constroem a sua identidade. Podem experimentar uma sensação de perda de identidade, confusão sobre quem são e conflitos internos em relação às suas origens familiares.

Como consequência, o filho influenciado ou alienado, pode apresentar alguns sinais que deverão ser sujeitos a uma avaliação pormenorizada, nomeadamente, alterações no sono e/ou alimentação, quebra do rendimento escolar; sentimentos constantes de raiva, tristeza, ódio contra o outro genitor e sua família; se recusar a ter qualquer comunicação com o outro genitor e familiares; guardar sentimentos negativos, exagerados ou não verdadeiros com relação ao outro genitor, podendo, ainda, apresentar distúrbios de natureza psicológica, tais como depressão, falta de atenção, ansiedade, apresentar baixa autoestima. 

Em resumo, a alienação parental pode ter consequências profundas e duradouras para o bem-estar das crianças e jovens envolvidos, afetando não apenas sua saúde emocional e psicológica, mas também para o seu desenvolvimento global e a sua qualidade de vida futura. Estas consequências destacam a importância de identificar e abordar a alienação parental de forma eficaz, visando proteger o bem-estar emocional e psicológico das crianças envolvidas. Intervenções precoces e apoio psicológico especializado para as crianças e jovens afetados (e sempre que possível para ambos os progenitores), bem como medidas legais para coibir a alienação parental, são essenciais para mitigar esses impactos negativos e promover um desenvolvimento saudável.