Explicar a guerra aos mais pequenos

Dra. Sophie Fachada

Psicóloga Clínica

Página da autora

Nos dias de hoje, é inevitável que as crianças se deparem com notícias e informações sobre conflitos e guerras através dos meios de comunicação, internet e conversas do dia-a-dia.

Estas notícias podem ser assustadoras e perturbadoras para os mais pequenos, que muitas vezes não compreendem completamente os motivos e as complexidades por trás desses eventos.

É importante abordar o tema da guerra com os mais pequenos de uma maneira sensível e construtiva. Além de ajudá-los a compreender o mundo complexo em que vivemos, abordar este tema de forma adequada pode promover o desenvolvimento de competências importantes para o seu crescimento emocional e social. Mas como fazê-lo? Aqui ficam algumas recomendações:

O fator idade

Primeiro que tudo é importante ter o cuidado de adaptar a linguagem e o conteúdo à idade e maturidade delas. As crianças mais pequenas ainda não conseguem compreender as nuances dos conflitos armados entre povo (muitas vezes nem eu adulta compreendo). No entanto, apesar de não compreenderem, estas crianças não deixam de ser sensíveis às emoções de medo e confusão que estes acontecimentos geram nos adultos em redor. Neste caso é adequado abordar a guerra do ponto de vista emocional, falando com a criança sobre as emoções negativas associadas à guerra: o medo, a angústia, a raiva, o desespero, a desconfiança, a culpa entre outras. Devemos conversar com a criança sobre estas emoções, sobre como é que elas nos fazem sentir. É importante que perceba que sentir estas emoções é normal, mas que há formas saudáveis de as exteriorizar e outras formas não saudáveis, por exemplo, magoando os outros ou a nós próprios (que é que acontece num conflito entre povos).

Transmitir segurança

Aborde o tema quando a criança estiver num ambiente seguro e acolhedor de forma a colmatar o efeito dos sentimentos negativos que possam surgir. É também importante que a criança se sinta à vontade para fazer perguntas e expressar seus sentimentos. No caso das crianças mais pequenas uma técnica possível é sentá-las ao colo ou baixar-se ao nível da criança. Reafirme para as crianças que estão seguras e protegidas, e que existem adultos, como os pais e outros cuidadores, que estão lá para ajudá-las e protegê-las. Transmita uma mensagem de esperança e resiliência, enfatizando que as pessoas trabalham juntas para resolver conflitos e promover a paz.

As imagens de violência

As crianças (e frequentemente os adultos), não conseguem fazer um processamento saudável de conteúdos violentos como imagens e conversas, nomeadamente no formato repetitivo que vemos na cobertura televisiva. Quando expostas a conteúdos violentos da guerra as crianças podem não falar mas muitas vezes dão sinais aos quais podemos estar atentos, por exemplo, mudam o comportamento quando o adulto está a ver este tipo de conteúdo no telejornal ou no telemóvel. 

Devemos evitar expor as crianças a imagens perturbadoras de guerra, mas ao mesmo tempo, não devemos ignorar completamente o assunto, até porque é impossível. Para as crianças, ver as imagens pode ser confuso, mas se acidentalmente forem expostas a conteúdos violentos na nossa presença devemos evitar a tentação de desligar logo a televisão porque pode aumentar a confusão. Uma estratégia possível nesta situação é focar a atenção da criança nas pessoas que estão no local de guerra a tentar corrigir aquele cenário porque o que está a acontecer não é bom (por exemplo os médicos, as ambulâncias, os polícias, etc.). Podemos ainda falar-lhes dos esforços de outros países e organizações para a paz que estão a fazer os possíveis para cessar o conflito.

Escutar

É importante permitir à criança expressar-se para conhecermos a sua perspetiva e medos relativamente àquilo que vê.

Particularmente à medida que crescem e se tornam mais conscientes do mundo ao seu redor, há que escutar para compreender e até saber a que tipo de conteúdos está exposta, por exemplo que comentários ouve na escola. No caso das crianças mais velhas podemos também encorajar o diálogo no qual são exploradas soluções pacíficas para os problemas que originam os conflitos.

Para além das mensagens verbais devemos estar atentos aos sinais de angústia e ansiedade nas crianças e procurar ajuda especializada se necessário.

Utilize atividades de expressão emocional: Ofereça às crianças oportunidades para expressar os seus sentimentos sobre a temática da guerra de forma criativa, como por exemplo através do desenho, pintura, escrita ou dramatização. Isto pode ajudá-las a processar e expressar as suas emoções e sentimentos de uma forma mais segura e construtiva.

Conclusão

Abordar o tema da guerra com as crianças de forma sensível e adaptada à sua idade é fundamental para promover características essenciais para o seu desenvolvimento emocional e social como: a consciencialização, a segurança emocional, a empatia e a compaixão. Ao criar um ambiente de comunicação aberta e segura, podemos ajudar as crianças a compreender o mundo complexo em que vivemos e a desenvolver habilidades importantes para enfrentar os desafios do futuro.

Divórcio: o que acontece quando fala mal do seu ex-companheiro à frente dos seus filhos.

Dra. Sophie Fachada

Psicóloga Clínica

Página da autora

Em caso de crise familiar é comum o conflito do casal se estender para os filhos, podendo chegar mesmo a chamada alienação parental, que ocorre quando um, ou ambos os progenitores, avós ou outra pessoa com responsabilidade legal da criança/jovem, manipula a relação entre a criança e o outro progenitor, geralmente com o objetivo de prejudicar ou destruir o vínculo afetivo entre a criança e outro progenitor. Essa manipulação pode envolver difamação, desinformação e alienação emocional, levando a criança a rejeitar ou a ter uma relação prejudicada com o progenitor não alienador.

Será importante referir que por vezes o alienador pode fazê-lo de forma quase inconsciente e até assumir o papel de vitimização que leva o filho a ver o outro progenitor como o principal culpado e até como agressor. É inclusivamente comum ouvir um alienador referir que só está a agir de acordo com o principal e único interesse o da criança.

Este síndrome está cada vez mais presente no nosso dia-a-dia, e a tornar-se um problema social, podendo ter impactos significativos no desenvolvimento emocional, psicológico e social das crianças e jovens envolvidos. Com base em estudos científicos na área da psicologia e psiquiatria, podemos destacar algumas consequências associadas à alienação parental:

  1. Problemas emocionais: Crianças e jovens submetidos à alienação parental frequentemente experimentam uma ampla gama de problemas emocionais, incluindo ansiedade, depressão, raiva, confusão emocional e baixa autoestima. A manipulação emocional e a exposição a conflitos entre os pais podem levar a sentimentos de desamparo e sentimentos de culpa decorrentes da pressão para rejeitar um dos pais.

  2. Dificuldades de relacionamento: A alienação parental pode prejudicar as habilidades sociais e de relacionamento das crianças e jovens, tornando-os mais propensos a ter dificuldades em estabelecer e manter relacionamentos saudáveis no futuro. Eles podem ter dificuldade em confiar nos outros, em expressar as suas emoções de forma adequada e em estabelecer vínculos afetivos seguros

  3. Problemas comportamentais: Podem exibir comportamentos desafiadores, agressivos ou de oposição como resultado do conflito interno causado pela alienação parental e pela lealdade dividida.

  4. Problemas académicos: A instabilidade emocional e a distração causada pela exposição à alienação parental pode interferir no desempenho académico das crianças e jovens, prejudicando a sua concentração, motivação e capacidade de aprendizagem. Eles podem ter dificuldade em se concentrar na escola, em completar tarefas escolares e em alcançar o seu pleno potencial académico.

  5. Risco aumentado de problemas de saúde mental: Estudos sugerem que crianças e jovens submetidos à alienação parental têm um maior risco de desenvolver problemas de saúde mental ao longo da vida, incluindo perturbações de humor, de ansiedade, de depressão, perturbação de personalidade e até mesmo pensamentos suicidas.

  6. Lealdade dividida e conflito de lealdade: As crianças e jovens envolvidos em situações de alienação parental muitas vezes sentem-se pressionados a tomar partido em relação a um dos pais, o que pode criar um conflito de lealdade significativo. Eles podem se sentir obrigados a escolher entre os pais, o que pode causar angústia emocional e sentimentos de culpa.
  7. Impacto na identidade e autoconceito: A manipulação parental pode afetar a forma como as crianças e jovens se percebem e constroem a sua identidade. Podem experimentar uma sensação de perda de identidade, confusão sobre quem são e conflitos internos em relação às suas origens familiares.

Como consequência, o filho influenciado ou alienado, pode apresentar alguns sinais que deverão ser sujeitos a uma avaliação pormenorizada, nomeadamente, alterações no sono e/ou alimentação, quebra do rendimento escolar; sentimentos constantes de raiva, tristeza, ódio contra o outro genitor e sua família; se recusar a ter qualquer comunicação com o outro genitor e familiares; guardar sentimentos negativos, exagerados ou não verdadeiros com relação ao outro genitor, podendo, ainda, apresentar distúrbios de natureza psicológica, tais como depressão, falta de atenção, ansiedade, apresentar baixa autoestima. 

Em resumo, a alienação parental pode ter consequências profundas e duradouras para o bem-estar das crianças e jovens envolvidos, afetando não apenas sua saúde emocional e psicológica, mas também para o seu desenvolvimento global e a sua qualidade de vida futura. Estas consequências destacam a importância de identificar e abordar a alienação parental de forma eficaz, visando proteger o bem-estar emocional e psicológico das crianças envolvidas. Intervenções precoces e apoio psicológico especializado para as crianças e jovens afetados (e sempre que possível para ambos os progenitores), bem como medidas legais para coibir a alienação parental, são essenciais para mitigar esses impactos negativos e promover um desenvolvimento saudável. 

Ecrãs – O Impacto no Desenvolvimento Infantil

Dr. Nabor Canilhas

Psicólogo Clínico

Página do autor

“De pequenino é que se torce o ecrãzinho”1 esta expressão popular reformulada tem vindo a assumir um significado cada vez mais fundamental na crescente problemática da exposição e utilização de ecrãs na primeira infância (até aos seis anos).     

Neste sentido, gostaria de colaborar para a reflexão sobre este tema que tanta preocupação tem despertado na prática clínica na infância pelo impacto que tem vindo a ter no desenvolvimento infantil. 

O problema

Como sabemos, atualmente os ecrãs estão disponíveis na maioria dos contextos (familiar, profissional, social) e a sua utilização é imprescindível no modo de vida atual. Esta utilização, que já era significativa, teve um aumento exponencial depois da pandemia COVID-19. Contudo, existem cada vez mais evidências dos riscos para o desenvolvimento global das crianças pequenas associados à utilização excessiva de ecrãs. 

A literatura diz-nos que nas crianças até aos 2 anos a utilização excessiva dos ecrãs pode alterar a plasticidade neuronal e afetar o neurodesenvolvimento favorecendo o aparecimento de atrasos no desenvolvimento da linguagem e da comunicação, competências sociais, emocionais, comportamentais e motoras2,3. Ficam alguns exemplos:

Linguagem: Em 2020 uma meta-análise concluiu que uma maior utilização de ecrãs (horas) está associada a um pior desenvolvimento da linguagem. Por outro lado, as crianças que iniciam mais tardiamente a utilização dos ecrãs têm um melhor desenvolvimento da linguagem4.

Sono: A utilização excessiva de ecrãs também influencia significativamente a qualidade e quantidade de sono. Estudos recentes sugerem que quanto mais cedo (antes dos 18 meses de idade) e quanto maior for o tempo de exposição a ecrãs, mais alterações de sono surgem (aumento da latência do sono, mais despertares noturnos menor tempo total de sono) em bebés e crianças até aos 6 anos de idade5,3.

Emoções: A literatura vem também sugerindo que a utilização de ecrãs está positivamente associada com problemas emocionais/comportamentais como dificuldades na tolerância à frustração, birras frequentes, ansiedade elevada e impulsividade nas crianças5,3

Recomendações

Neste sentido, será fundamental limitar o uso de ecrãs em crianças pequenas, alertar para os riscos do seu uso excessivo, e sugerir algumas recomendações para crianças até à idade pré-escolar:

– Limitar a exposição: Tanto a Academia Americana de Pediatria (AAP) como a Organização Mundial de Saúde (OMS) apontam atualmente para limitações significativas na exposição das crianças aos ecrãs.

● Até aos 2 anos, as recomendações são para evitar os ecrãs (televisão, tablet e principalmente telemóveis). 

● Após os 2 anos, os pais podem começar a apresentar alguns programas de “alta qualidade educativa”, contudo, deverão ser os próprios pais a mostrar aos seus filhos, para responder a quaisquer perguntas que possam ter e controlar os conteúdos. 

● Até aos 5 anos, as recomendações sugerem limitar o consumo de ecrãs a 1 hora diária (programas educativos de qualidade) novamente com a ressalva de que os pais devem ver conjuntamente com os filhos (“e não lhes dar um tablet ou telemóvel para as mãos sem controlo parental”).

– Comece por dar o exemplo desde cedo:

● Mesmo antes das crianças terem tablet ou telemóvel próprio, mostre-lhes como devem ser utilizados. Não utilize o telemóvel na hora das refeições, olhe para as pessoas (principalmente para os seus filhos) quando elas falarem consigo (e não para o telemóvel). 

● Lembre-se de que são os pais os modelos que os filhos mais observam e é com os pais que os filhos mais aprendem. 

– Não subestime o valor dos brinquedos tradicionais e dos espaços ao ar livre:

●  É importante que as crianças experimentem uma “brincadeira livre” e não estruturada, o que significa que elas decidem o que fazer e como fazer, e estão simplesmente a brincar (e não a tentar chegar ao próximo nível de um jogo). Este tipo de brincadeira permite que as crianças:

  • Mexam-se ao seu próprio ritmo, em vez de serem conduzidas (ou apressadas) por qualquer jogo digital de movimento rápido;
  • Desenvolvam a criatividade e a experiência em tomar decisões;
  • Pratiquem a partilha e o trabalho de equipa com outras crianças ou adultos (pais, familiares); 

●    As aplicações e os jogos digitais – por mais educativos que afirmam ser – não substituem o tipo de aprendizagem que ocorre naturalmente às crianças, se o permitirmos.

– Deixe o tablet em casa e os telemóveis são para os adultos:

●  Embora sejam úteis durante longas viagens, os tablets e outros dispositivos não deverão estar disponíveis quando as crianças forem no carrinho ou a passear, assim como quando vão para a escola;

●   É importante que as crianças mais novas tenham a oportunidade de olhar à sua volta e encontrem entretenimento e distrações (e aprendizagens) no mundo real também.

A finalizar, sugerimos ainda que a televisão e outros ecrãs devem estar desligados enquanto as crianças brincam, para que não haja distrações no processo criativo da brincadeira livre. Importa ainda referir que o uso dos ecrãs (tablet, telemóvel dos pais) como uma ferramenta para “calar” as crianças, não é nada aconselhável. As crianças deverão desenvolver competências de autorregulação e aprender a lidar com a frustração. Assim, procure juntamente com a criança, descobrir qual a melhor forma de resolver o problema, inventar alternativas para evitar o aborrecimento, acalmá-la e descobrir outras estratégias para canalizar as emoções.

Referências 

  1. Pereira, T. (2023, 16 de maio). De pequenino é que se torce o ecrãzinho. Sábado. https://www.sabado.pt/opiniao/convidados/tiago-pereira/detalhe/de-pequenino-e-que-se-torce-o-ecrazinho
  2. Heffler, K. F., & Oestreicher, L. M. (2016). Causation model of autism: Audiovisual brain specialization in infancy competes with social brain networks. Medical hypotheses, 91, 114–122. https://doi.org/10.1016/j.mehy.2015.06.019
  3. Li, C., Cheng, G., Sha, T., Cheng, W., & Yan, Y. (2020). The Relationships between Screen Use and Health Indicators among Infants, Toddlers, and Preschoolers: A Meta-Analysis and Systematic Review. International journal of environmental research and public health, 17(19), 7324. https://doi.org/10.3390/ijerph17197324
  4. Madigan, S., McArthur, B. A., Anhorn, C., Eirich, R., & Christakis, D. A. (2020). Associations Between Screen Use and Child Language Skills: A Systematic Review and Meta-analysis. JAMA pediatrics, 174(7), 665–675. https://doi.org/10.1001/jamapediatrics.2020.0327
  5. Janssen, X., Martin, A., Hughes, A. R., Hill, C. M., Kotronoulas, G., & Hesketh, K. R. (2020). Associations of screen time, sedentary time and physical activity with sleep in under 5s: A systematic review and meta-analysis. Sleep medicine reviews, 49, 101226. https://doi.org/10.1016/j.smrv.2019.101226

O Amor (Próprio)

Dra. Marta Flores

Psicóloga Clínica

Página da autora

Neste mês do amor, convido-vos a fazer uma reflexão sobre o impacto do afeto e do carinho do outro em nós.

Para alguns de nós pode não ser fácil receber o afeto do outro, seja ele em que formato for: um beijo, um abraço, um sorriso, uma surpresa, uma palavra…

Podemos ter dificuldade em deixar entrar dentro de nós estes gestos afetivos, em aceitarmos o reconhecimento ou assumir a nossa valorização. Desconfiamos do outro e daquilo que nos quer dar, sentimos que não merecemos, não somos dignos, não é para nós. 

Deixar entrar alguém no nosso mundo pode parecer assustador, sentimo-nos vulneráveis, perdemos a sensação de controlo e podemos acabar por evitar ou afastar esta experiência com medo que seja dolorosa. 

É preciso permitirmo-nos sentir…

O processo de aceitar afeto pode ser difícil…para que possamos aprender a receber é preciso parar, sentar connosco próprios e estar atentos ao que sentimos cá dentro e ao impacto interno daquilo que o outro nos deu. 

O que sinto quando o outro é carinhoso comigo? Sinto-me merecedor / merecedora de amor? Quando olho para mim, o que vejo?

O processo de aceitar e saber receber também está relacionado com a nossa auto-estima, a forma como olhamos para nós e nos vemos, com as nossas experiências passadas, com as relações precoces que tivemos…quando nos permitimos receber abrimos espaço para a construção de novas experiências, novas crenças, novas formas de nos olharmos e contemplarmos.

Re(construímo-nos) aceitando que somos merecedores de amor, de afeto, de carinho, confiando que aquilo que o outro que nos dá é verdadeiro e tem valor.

Podemos mesmo pedir ao outro que nos dê afeto aos poucos, ao invés de manifestar o seu sentimento com intensidade, para que possamos ir gerindo dentro de nós, para tomarmos o nosso tempo para assimilar e processar aos invés de evitar ou afastar. 

Neste mês do amor (e sempre ) lembre-se de também ser amável consigo! 

Natal (des)encantado

Dra. Marta Flores

Psicóloga Clínica

Página da autora

Se lhe falar em prendas, luzes, decoração, música, chocolate quente, união, alegria…automaticamente lembra-se da época de Natal? Sim? E se lhe falar em tristeza, ansiedade, depressão, isolamento e solidão. Também associa estas sensações à época de Natal?

Em dezembro, somos arrebatados e levados para um lugar mágico onde parece que nada de mal nos pode acontecer, onde os problemas ficam longe e onde somos obrigados a ser felizes o tempo todo. As luzes que piscam mantêm-nos atentos a elas, as músicas que ecoam nas ruas transmitem alegria, o cheiro a lareira traz-nos recordações que nos aquecem o coração, a procura do pinheiro perfeito e das decorações perfeitas são o nosso foco, enfim, quase que colocamnos em pausa a nossa vida atribulada e complexa e entramos num ritmo diferente. Contudo, o Natal pode trazer emoções contraditórias.

Podemos sentir a falta de um ente querido quando notamos um lugar vazio à mesa. Podemos sentir-nos sozinhos por estar longe da família. Podemos sentir ansiedade e stress quando não encontramos o presente perfeito. Podemos sentir-nos frustrados por ter gasto mais do que aquilo que nos era possível. Podemos sentir raiva quando sabemos que não temos a família perfeita que parece existir nos anúncios televisivos. Podemos sentir que falhámos se terminamos o ano com um divórcio ou uma separação.

É importante permitirmos a nós mesmos sentir estas sensações e emoções menos boas, mesmo numa altura em que parece que estas têm de ser camufladas por não ficarem bem no quadro natalicio. Por sua vez, a aproximação do final do ano pode também trazer consigo um impacto negativo na nossa saúde mental e pode aumentar estas sensações e emoções.

Colocamos tudo em perspetiva e muitas vezes percebemos que não atingimos os objetivos que tínhamos delineados, não estamos onde desejávamos estar, parece que não saímos do lugar, mesmo quando os anos passam.

Proponho que este ano, em vez de nos punirmos por tudo aquilo que ainda nos falta alcançar, tentemos identificar as pequenas vitórias e sucessos que fomos vivendo ao longo do ano.

Partilho com vocês algumas dicas para que possam viver esta época com mais saúde mental:

– fazer uma lista de pequenas coisas que me fizeram feliz este ano;

– ajustar as expetativas: não somos perfeitos, não temos a família perfeita;- tentar sempre dar o nosso melhor é suficiente;

– se se sentir triste ou ansioso fale com um amigo, combine um encontro com alguém que não vê há muito tempo;

– se perdeu um ente querido recentemente ou recorda com saudade alguém que já não está presente procure alguém com quem partilhar como se sente;

– procure estar com amigos e familiares;

– não faça comparações da sua vida com a vida dos outros;

– não se deixe levar pelo excessivo consumismo, compre apenas o que precisa.

Se estas sensações ou emoções negativas não aliviarem depois desta época, procurar ajuda especializada como um psicólogo ou psicóloga pode ajudar!

Vamos tentar relaxar um bocadinho, avizinha-se um novo ano para continuar a tentar ser melhor e fazer melhor!

2 histórias que me fizeram ser psicóloga

Patrícia Barroso

Psicóloga Clínica

Sobre a autora.

Embora os nomes sejam fictícios as pessoas e os eventos nestas duas histórias são verídicos.

Joana
Na minha infância vi de perto o poder da psicologia num processo de luto.

Joana era uma menina de 11 anos que tinha uma excelente relação com o pai. Já com a mãe a relação era mais difícil.

Acontece que prematuramente o pai da Joana faleceu e foi como se lhe tirassem o chão debaixo dos pés. Deu-se origem a uma situação muito difícil pois aquela menina viu-se confrontada com uma perda tremendamente dolorosa e ao mesmo tempo sem poder recorrer a quem era o seu porto seguro, a pessoa que melhor a compreendia. Nesta encruzilhada acabou por chegar até um psicólogo.

Com o apoio do terapeuta, a Joana conseguiu encontrar maneiras saudáveis de lidar com a dor e “seguir em frente”. A relação com a sua mãe também melhorou bastante. Mãe e filha, que antes se focavam nos pontos de divergência, passaram a encontra maneiras de se apoiarem uma à outra.

Testemunhar esta história ensinou-me que podemos superar momentos de grande dor e que as relações difíceis podem ser reabilitadas e transformar-se em boas relações para ambas as partes. Uma vez mais observei o poder do psicólogo para proporcionar conforto e orientação em momentos de grande tristeza e desânimo.

Lourenço

Conheci o Lourenço na minha infância, um severo caso de mau comportamento.

Conhecido como “menino difícil”, o Lourenço faltava à escola e, quando não faltava, era para perturbar aulas: interrompia os professores com comentários sarcásticos e desagradáveis, gozava com os colegas, partia-lhes coisas, batia-lhes, uma situação muito complicada.

Os pais não sabiam o que fazer no meio de uma chuva de queixas dos professores. Desesperados, acabaram por decidir experimentar algo que, na altura, não era muito comum em Portugal: enviar o Lourenço ao psicólogo.

A transformação começou devagarinho, a interação com os colegas foi melhorando assim como a assiduidade. Algumas pessoas ainda estavam céticas mas quando o Lourenço começou a ser positivamente participativo nas aulas já ninguém podia negar a mudança. Posso dizer que com o passar do tempo acabou por se revelar um excelente aluno.

Mais tarde compreendi qual era o cerne do problema: aquele menino não tinha estabilidade no seu contexto familiar. Os pais tinham constantes discussões, ameaçavam separar-se, e o Lourenço assistia a tudo. Os comportamentos inadequados eram uma forma de expressar essas vivências.

Quantas crianças não vivem situações em que são injustamente julgadas, em que não recebem a ajuda necessária, porque os adultos confundem os sintomas com o problema? Felizmente este não foi o caso do Lourenço que aprendeu a lidar com as suas emoções e a reconstruir a sua vida.

Conhecer o Lourenço e perceber o papel crucial do psicólogo na sua recuperação inspirou-me profundamente.

Foi com estas histórias que o sonho de ser psicóloga floresceu em mim e à medida que fui tendo contacto com esta área, primeiro na disciplina de psicologia no secundário e depois na universidade, foi-se fortalecendo a paixão por esta profissão tão bonita. Os anos passaram mas eu continuo motivada por ajudar os outros a lidarem com os desafios da vida e a compreenderem-se a si mesmos.

Patrícia Barroso (sobre a autora)

Olá, ansiedade, estás de volta?

Marta Flores

Psicóloga Clínica

Sobre a autora.

Sabe aquela sensação de desconforto, de alerta, ou até de medo, que nos mantém vigilantes, à espera de que algo aconteça? E que desejamos sempre que desapareça muito rapidamente e que não volte? Todos nós já nos sentimos assim em algum momento da nossa vida!

O que podemos não ter consciência é que a ansiedade também pode ser boa e desempenhar um papel que nos ajuda a ser produtivos e ou até mesmo a atingir o sucesso! 

Como assim?

Naquela apresentação importante no trabalho; na preparação para aquele teste difícil da secundária; naquela viagem à noite numa estrada desconhecida em que se manteve alerta durante todo o percurso…a ansiedade desempenhou uma importante função de adaptação e até mesmo de sobrevivência! 

Mas e quando é que ela se torna numa ansiedade desadaptativa?

Quando existem sensações que não conseguimos controlar e que podem interferir com a normalidade do nosso dia-a-dia. Estas sensações podem ser coisas como: desmaios, tonturas, dores no peito, arritmias, mãos suadas, diminuição da força, sensação de falta de controlo na nossa cabeça e no nosso corpo…. Quando estas sensações são intensas e frequentes podem ser assustadoras.

Este tipo de ansiedade é sinal de que existe um problema. Podemos ignorar, colocando a ansiedade numa gaveta bem trancada, bem no fundo do nosso armário. Mas como o problema continua a existir a ansiedade só vai crescer aparecendo em sítios onde anteriormente não a víamos, não a sentíamos.

Em vez de ignorar devemos sim ouvir o que a ansiedade tem para dizer e assim entender a sua origem. Mas como?

Por exemplo, num local tranquilo, procure relaxar com recurso à respiração controlada, inspirando devagarinho como se estivesse a cheirar uma flor e expirando lentamente, como se estivesse a soprar uma vela. Apenas 2 minutos de exercícios de respiração como este podem ajudar-nos a acalmar. Com essa tranquilidade ficamos mais capazes de refletir e de identificar quais as situações que despontam ansiedade em nós. Ao identificarmos as situações vamos compreender verdadeiro porquê de nos sentirmos ansiosos. Outra estratégia passa por elaborar um diário onde escrevemos como nos fomos sentindo e o que fomos pensando ao longo do dia, o que uma vez mais nos ajuda a refletir e a identificar as causas da nossa ansiedade. Tendo identificado as causas, podemos começar a trabalhar para fazer as mudanças necessárias para ultrapassar os obstáculos.

Se continua a sentir dificuldade em gerir a sua ansiedade sozinho mesmo tentando aplicar estas e ou outras estratégias, fale connosco, um psicólogo ou psicóloga, pode ajudar.

Por mais desorganizados que a ansiedade nos deixe, é possível aprender a geri-la, procurando recursos para lidar com ela, é possível aprender a tratá-la por tu!

Olá, ansiedade, estás de volta? O que me queres dizer?

Marta Flores (sobre a autora)

Como ser feliz no trabalho?

Cláudia Gaspar

Psicóloga Educacional

Sobre a autora.

Escolhe um trabalho que gostes, e não terás de trabalhar nem um dia na tua vida”. A célebre frase de Confúcio ilustra bem aquela que é uma das realizações mais ambicionadas por grande parte das pessoas: ser feliz no trabalho. Ainda que tenhamos uma profissão exigente ou uma função de grande responsabilidade, quando entramos e saímos do local de trabalho com um sorriso no rosto, tudo fica mais leve. Por outras palavras, quem corre por gosto, não cansa. Mas o que é que realmente vai criar este gosto?

Existem 5 razões para o trabalho nos fazer felizes:

  1. Propósito: Se acreditar que o seu trabalho o está a ajudar a caminhar para um propósito maior isso irá aumentar a sua motivação. Quando o propósito é muito importante conseguimos dar a volta às situações mais desafiadoras.
  1. Oportunidades de crescimento: Se o seu desejo é crescer é importante que no seu trabalho tenha a oportunidade e os meios para enfrentar desafios. Estar estagnado e entediado com as tarefas diárias do trabalho é uma verdadeira tortura para quem procura o desenvolvimento profissional.
  1. Bom ambiente de trabalho: Um ambiente de positivo onde há boa comunicação, apoio mútuo e onde as pessoas se sentem valorizadas afeta drasticamente a satisfação no trabalho. Diria mesmo que ser feliz no trabalho é impossível num ambiente tóxico.
  1. Equilíbrio entre a vida pessoal e profissional: Se o seu trabalho lhe deixa espaço para cuidar de si mesmo e aproveitar a vida pessoal isso terá um impacto positivo na sua felicidade. Embora este equilíbrio não seja essencial para a felicidade no trabalho (especialmente no caso dos profissionais mais jovens) ele é essencial para a maioria das pessoas, nomeadamente quando existem responsabilidades familiares.
  1. Rever-se nos valores ou missão da empresa: Se aquilo que faz diariamente choca de alguma forma com os seus princípios, com a sua maneira de ser, inevitavelmente vai sentir-se desiludido. Se compartilha dos valores ou da missão da empresa em que trabalha, isso contribuirá para a sua motivação e felicidade.

“Estou infeliz no trabalho, e agora?”

Agora é necessário refletir sobre estes aspectos, identificar as causas e efetivar mudanças. Mudar pode ser difícil, sim, mas este é um caminho que vale a pena pois leva ao seu desenvolvimento pessoal.

E se precisar de ajuda, conte comigo.